Algoritmos que privilegiam engajamento vêm ampliando a circulação de discursos de ódio na internet e condicionando usuários a reagirem com hostilidade, apontam estudos recentes de órgãos internacionais, entidades de pesquisa e relatórios internos das próprias plataformas.
Escalada de ataques virtuais
Levantamento da Organização das Nações Unidas (ONU) indica que 81% dos brasileiros consultados em 2024 já foram alvos de discurso de ódio online, sobretudo por questões de gênero, raça, religião e orientação sexual. Entre crianças e adolescentes, a pesquisa TIC Kids Online 2024 mostra que três em cada dez jovens sofreram ofensas pessoais na rede.
Em períodos eleitorais, o fenômeno se intensifica. Dados da SaferNet revelam que as denúncias de crimes de ódio na internet cresceram 39,3% em 2022, na comparação com 2021. A xenofobia disparou 821%, a intolerância religiosa 522% e a misoginia 184%. Historicamente, anos de eleição concentram saltos de até 650% nas queixas registradas pela entidade.
Tendência global
Após os ataques do Hamas, em 7 de outubro de 2023, comentários antissemitas no YouTube subiram 4.963% em poucos dias. Na Índia, postagens contra minorias religiosas avançaram 74% em 2024. A ONU destaca ainda o aumento alarmante de mensagens antimuçulmanas em várias plataformas digitais.
Como o mecanismo funciona
Estudo publicado nos Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) indica que conteúdos atacando grupos rivais têm o dobro de chance de serem compartilhados em comparação a mensagens positivas sobre o próprio grupo. Documentos internos do Facebook mostraram que, por um período, a rede atribuía peso cinco vezes maior às reações de raiva do que aos tradicionais “curtidas”, o que impulsionava publicações tóxicas. Após identificar a correlação entre raiva e desinformação, a empresa reduziu essa relevância.
Uma auditoria acadêmica divulgada em 2025 concluiu que o sistema de ranqueamento do X (antigo Twitter) amplifica postagens hostis a grupos externos, contrariando as preferências declaradas dos próprios usuários.
Efeitos fora da tela
Pesquisa realizada na Alemanha constatou que vítimas de discurso de ódio online sentem mais insegurança no cotidiano offline do que pessoas atacadas apenas presencialmente. O estudo sugere que a hostilidade digital molda a percepção de segurança e pertencimento ao permanecer acessível 24 horas por dia nos dispositivos móveis.
Imagem: Internet
O contato repetido com esses conteúdos também reforça padrões de comportamento. Duas em cada três pessoas relataram ter visto mensagens hostis quase diariamente entre agosto de 2022 e setembro de 2023, segundo dados compilados pelo Center for Countering Digital Hate.
Monetização da raiva
Análise de postagens no X revelou que tweets contendo termos ofensivos receberam 70% mais curtidas por dia do que mensagens aleatórias, enquanto o crescimento médio dos demais conteúdos foi de 22%. A capacidade de gerar cliques e reações rápidas transforma emoções negativas em ativo comercial para as plataformas.
Risco de retrocesso na moderação
Em janeiro de 2025, a Meta anunciou mudança que reduz a moderação proativa e passa a depender principalmente de denúncias de usuários. O Center for Countering Digital Hate estima que a medida possa resultar em 277 milhões de publicações nocivas adicionais por ano, incluindo violência, bullying e discurso de ódio.
Especialistas alertam que, ao consolidar a raiva como forma recorrente de expressão, as redes sociais criam um ciclo difícil de romper, em que conteúdos hostis geram engajamento, que por sua vez alimenta novos ataques.
Com informações de Terra





